Fevereiro de 2008, Londres

Inês, irmã, cara minha...

Esta carta é só sua. Esse pedaço de papel todo rabiscado que você tanto queria! Agora, por favor, não o deixe jogado junto às meias sujas debaixo da cama, nem nos emaranhados do Leon. Não dê trabalho para a mamãe, ok?

O sermão já acabou, prometo; pode continuar lendo sem medo de ser feliz. Pois bem, sinta-se honrada de ser a primeira da família a receber notícias minhas pelas vias do meu ofício. Estive pensando em você esses dias (não pelo fato de ter gritado comigo pelo telefone há dois dias atrás, não...), mas acho que agora descobri o motivo de ainda continuar com essa bola de pelos ronronante sujando seu quarto. Quero dizer, no meio das tralhas, mesmo que esse apartamento seja pequeno, me sinto meio sozinho às vezes. Seria bom ter uma companhia.

Pois é, você está imaginando certo. O que acha de uma companheira para o Leon? Claro, eles só se veriam poucas vezes por ano, mas creio que a graça está toda aí, não?

Hm.

Minto. Não me darei bem com um gato. Ele e eu disputaríamos o sofá que, alias, já é canto bem concorrido da casa entre o Walter e eu. Ah, sim, ele está ótimo como sempre. Sei que gostaria de ter uma carta dele, e não minha, por isso fiz questão de mencioná-lo - e anexar uma foto de nós dois feita pelo Gerard (o francês meio maluco que mora do outro lado do corredor sobre o qual comentei ao telefone).

Infelizmente não tem nada que atraia Leon nela. Por enquanto, pelo menos. Então só dê uns tapinhas na barriga grande e peluda dele, por mim. Quando vier me visitar reservarei um canto da sala só para ele.

De qualquer modo, cuide bem desse gato guloso enquanto não precisa mais cuidar de mim. Não se preocupe; estou me alimentando bem, me agasalhando bem, e escrevendo muito bem também, obrigado (apesar de que, na visão dos grandes editores atuais eu seja "só mais um") .

Cuide da mamãe e tenha certeza de que, dentre todos os gatos do mundo, Leon é o mais feliz.



Com amor,